Compliance no Terceiro Setor
- 25/03/2020 16:28
O presente resumo traça uma reflexão sobre a importância de as organizações do terceiro setor adotarem de maneira sólida e comprometida instrumentos de compliance em sua administração. Frente ao fenômeno da corrupção, a escassez dos recursos públicos e a necessidade da efetivação das políticas públicas, é cogente e vem sendo debatido, talvez não implementado com a agilidade necessária, o compliance na administração pública.
Diante do fato de que o terceiro setor é composto por organizações privadas sem fins lucrativos que atuam em prol de interesses sociais, desempenhando papel de extrema relevância na consolidação dos direitos sociais e atuando muitas vezes através de parcerias com a administração pública, devem também atentar-se para as boas práticas administrativas com a implementação de instrumentos de compliance que lhes confiram maior segurança e confiabilidade.
Como bem salientam Grazzioli e Paes , é característica bastante presente nas organizações do terceiro setor o comprometimento dos administradores com a regularidade das entidades, o que os faz buscar as melhores soluções em favor do interesse público e social. No entanto, na prática, por falta de um modelo interno bem estruturado ou mesmo por falta de conhecimento, o comprometimento acaba sendo infrutífero, expondo as organizações a uma série de riscos e causando-lhes uma série de prejuízos.
O compliance vem sendo praticado no mundo corporativo, principalmente pelas empresas de capital aberto há algum tempo e mais recentemente passou-se a tratar da aplicação desta ferramenta no âmbito da administração pública o que, para Perez Filho , com as devidas adaptações, diante da capilaridade das ações da administração na vida dos cidadãos, pode representar “um importante auxílio para se atender aos ditames constitucionais e promover, de fato, o interesse público”. Do mesmo modo, se aplicado com as adaptações necessárias e de modo comprometido nas entidades do terceiro setor, o compliance poderá ser um instrumento eficiente para garantir boas práticas de gestão e o melhor uso dos recursos para o alcance dos objetivos sociais das organizações.
O termo compliance tem origem no verbo inglês to comply, que significa “cumprir com”, “de conformidade com”. Perez Filho apresenta a conceituação de compliance traçada por Coimbra e Manzi, sendo “o dever de cumprir, de estar em conformidade e fazer cumprir leis, diretrizes, regulamentos internos e externos, buscando mitigar o risco atrelado à reputação e o risco legal/regulatório”.
Este estudo não objetiva trazer técnicas de implantação de compliance, mas cabe salientar que, conforme Perez Filho , as “linhas mestras” do compliance na administração pública são os princípios contidos no art. 37 da CF/88. Do mesmo modo, conclui-se que ao menos no que tange às parcerias das organizações do terceiro setor com a administração pública, os mesmos princípios devem ser os norteadores de suas condutas. A seguir apresenta-se um panorama geral do que vem a ser um programa de compliance.
O programa de compliance abarca o atendimento a leis, regulações, normas internas e às finalidades da organização, seja ela pública ou privada. Significa uma autovigilância nos mais diversos aspectos do negócio desenvolvido pela sociedade privada e, no âmbito público, das competências outorgadas aos entes, pela legislação. Trata-se da ideia de prevenção geral como sustentáculo da organização e garantia de sua perenidade em todas as áreas envolvidas na consecução de seus fins, mas não só isso, pois também auxilia no fortalecimento dos valores organizacionais, atuando como fonte propagadora dos princípios caros à organização. Em outros termos: minimiza-se riscos na medida em que também auxilia para a formação de uma nova cultura organizacional. (Perez Filho, 2019, p. 77).
Pontuam-se diversas razões para que as entidades adotem uma gestão dotada de processos modernos com boas práticas de governança. Dentre elas, está o fato de que as organizações do terceiro setor não podem mais contar somente com doações, atos de filantropia para o sustento de suas obras, sendo necessário muitas vezes buscar a sustentabilidade através de produtos ou serviços próprios, o que exige em certa medida a adoção de uma atitude empreendedora, claro, sempre com vistas a custear suas atividades fim, possibilitando que suas ações sociais perdurem no tempo.
Outra razão é o fato de que estas Instituições atuam na execução de políticas públicas, muitas vezes por meio de parcerias com a administração pública, de forma remunerada ou não, estando sujeitas ao controle externo de diversos órgãos estatais. Assim, é de extrema importância que respeitem as regras e normas legais existentes. Internalizar meios de controle através de um estatuto social bem elaborado e outros regramentos internos e implementá-los na prática, permite um gerenciamento de riscos mais eficiente e uma governança mais proativa que permita direcionar a conduta dos seus colaboradores de maneira correta e identificar e corrigir eventuais irregularidades ou desvios .
Além disso, como apontam Grazzioli e Sabo Paes (2018, p. 81), ao adotar “ferramentas de integridade como instrumentos internos de regulação de partes relacionadas e de políticas internas de gestão de pessoas, de processos e de riscos financeiros” , as entidades fortalecem sua imagem perante a sociedade, a administração, os órgãos de controle, seus parceiros e fornecedores.
Como já referido, frente à necessidade global de combate à corrupção em todas as esferas, no Brasil impulsionada em 2014, passou-se a abordar a aplicação de compliance na administração pública. Vez que o Terceiro Setor atua diretamente em conjunto com a administração na execução de políticas públicas é essencial que também adote a programas de integridade. Castro e Ziliotto abordam o compliance como “pilar de contratações sustentáveis”, abordando que a integridade está intimamente ligada ao desenvolvimento sustentável, pois para garantir a sustentabilidade da economia, a evolução da sociedade e do meio ambiente é necessário que o mercado e o Estado (bem como o terceiro setor) sejam compromissados com a implementação de mecanismos aptos a combater a corrupção, que afeta a toda a população, em especial as camadas sociais que mais necessitam dos serviços públicos essenciais.
Débora Bitencourt Machado Andreazza